Eu e a ciência         

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O tempo realmente não para. Outro dia eu estava brincando de circo em Picuí, Paraíba, quando da minha primeira infância. Na adolescência eu estava fazendo teatro em Parahyba. Outro dia eu estava na Universidade cursando engenharia mecânica; estudando de segunda a segunda. Muito cálculo e muita física, conhecimentos que se servem até hoje, apesar de não trabalhar mais como engenheiro. Esses conhecimentos são úteis no meu cotidiano porque me permitem enxergar, além de ver a vida, pela ótica da ciência racional. Sem querer ser redundante, afirmo que outro dia estava fazendo teatro. São tantos outros dias; tantos acertos e tantos erros. Tantas leituras; tantas viagens; tantas pessoas “bonitas” passaram por mim e tantas outras continuam. É um labirinto de aprendizagem e ensinamentos. Há pouco tempo eu estava na flor da idade, com meus 30 anos, iniciando minha carreira profissional. Mas hoje me dou conta que estou com 60 anos e continuo ensinando e aprendendo.

Tenho consciência de que ao me referir ao termo “ciência racional” devo ter provocado tensões quanto à questão: há ciência que não seja racional? Ao ler “O livro dos espíritos” de Allan Kardec e, recentemente, ver o filme “Kardec” com direção de Wagner de Assis, me convenci que há, sim, ciência cujos resultados são oriundos de pesquisas de ordem qualitativa e não necessariamente quantitativa. Sou convencido de que o comportamento humano, além da formação fruto, de valores morais, educacionais e culturais, passa pelo amadurecimento espiritual; é conduzido pela vertente conotativa que nos faz seres sociáveis.

Ao me ver no espelho e ler o que escrevo, compreendo que, de fato, sou um ser em mutação, eclético e conotativo. Não sou o mesmo de ontem, assim com amanhã não serei o mesmo de hoje. Meus poucos cabelos, brancos, as marcas faciais, a necessidade de cuidados com a alimentação, consequentemente, com a saúde e o acúmulo de conhecimento me fazem pensar pela ótica socrática de que “só sei que nada sei”. Essa compreensão é uma dádiva do amadurecimento, o que, necessariamente não diz respeito à idade.

O outro ser que hoje mora em mim, não será o mesmo amanhã; e, certamente, não será o mesmo mais tarde. O artista que se tornou engenheiro, que se tornou professor, que se tornou escritor, é um ser em constante mutação. Essas mudanças são os fatores que devem ser trabalhados para que possamos crescer materialmente; mas, principalmente, evoluir espiritualmente. Esse argumento não se trata de religião, mas de filosofia e ciência passando pela ótica cristã.

A ciência tradicional não explica o orgulho, a inveja, a vaidade, esses valores que precisamos trabalhar em nós antes de apontarmos o dedo para alguém. Da mesma forma não explica porque falamos tanto de e no amor de forma tão simplista e negociável. Como explicar e convencer que o amor é incondicional? Se assim não for, não é amor! A carga energética que aflora através do sentimento nos transforma, fazendo do adulto uma criança, possibilitando viagens que só o coração sente, conduzida pela alma que nos completa.

A nota musical que toca meu coração age como o impulso e pulso, a energia que transmite o sentimento de, figurativamente, encontrar alguém que amo, mas não nos víamos há muito tempo.  É a corrente energética que transmite o amor. Frases como: “A toda ação corresponde uma reação”, “Ame o próximo como a si próprio” são determinantes para compreendermos o fluxo energético que faz a vida ter sentido. É a lei do retorno! Em contrapartida os materialistas insistem em ser simplistas, chegando ao ponto de tornar a racionalidade do uso de um poço raso, que pode ter água limpa, em algo que pode ser explorado até secar.

Ao olhar uma criança brincando com um livro, um caderno, um jogo, há quem veja uma perda de tempo; não sabe o raso leitor, que ele vê, mas não enxerga o mundo que, elasticamente, se multiplica na cabeça e no coração de uma criança que vive experiências com atividades lúdicas. É uma formação essencial para edificar a sensibilidade, a cognição e a percepção do mundo. A escola que não investir nessa perspectiva está contribuindo para a formação de gerações depressivas, inseguras e insensíveis.

A minha relação com a ciência vem desde minha graduação em engenharia mecânica, de fato, desde o ensino médio. O acúmulo de conhecimento, por esses anos todos, gerou a tese, ou melhor, minha compreensão de mundo que é leitura de que tudo que gera conhecimento é ciência. Essa reflexão faz parte dos meus estudos de doutorado. Para muitas pessoas a ciência só existe onde há pensamentos quantitativos. É a lógica cartesiana do pensamento numérico. Ledo engano! No meu romance “Amor invisível”, fruto da tese do doutorado, cito o mestre Elliot Eisner quando este afirma que “as artes, da mesma forma que as ciências, podem ajudar-nos a compreender o mundo no qual vivemos” (EISNER, 2004, p.206). Portanto quem faz pesquisa com ou através da arte, focando a subjetividade humana, está fazendo ciência.

Pode parecer uma heresia para os herméticos das ciências médicas e exatas; que eles me desculpem, mas além de artista eu sou um cientista. A arte, assim como a ciência fazem parte de mim e eu não vivo sem elas.

Carlos Cartaxo