Indústria têxtil expande cultivo do algodão colorido orgânico para atender o mercado de decoração sustentável

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Sob o luar do sertão o sonho da farta colheita foi realizado. A última grande seca na Paraíba durou seis anos, mas desta vez a estiagem não impediu que o algodão colorido germinasse no solo árido da cidade de São Bento. Para o agricultor Flaviano Alves, que estava com dificuldades pela falta de água e ausência de financiamento, o projeto de expansão do plantio do Algodão Colorido da Paraíba surgiu, em suas palavras, “como uma luz no fim do túnel”. Ele recebeu as sementes gratuitamente e colheu este mês uma safra de cerca de 1200 quilos. Agora já planeja dobrar a produção. A motivação vem da prática de contrato de compra garantida com pagamento imediato na entrega – o que dá credibilidade e traz entusiasmo aos agricultores.

Desde o início do ano, a empresa têxtil Santa Luzia Redes e Decoração vem espalhando sementes na região. O projeto de expansão do cultivo inclui 40 famílias que trabalham em sistema de agricultura familiar em assentamentos, associações e comunidade quilombola. São 20 novos hectares plantados com colheita de cerca de 24 toneladas de algodão colorido que será transformada em fios, tecidos, utilitários e acessórios de decoração vendidos para o mercado nacional e internacional.

Armando Dantas, CEO da empresa, já tem a experiência bem sucedida com o plantio e colheita do algodão colorido. Desde 2012 ele trabalha neste sistema com os agricultores do Assentamento Margarida Maria Alves, em Juarez Távora, também no semiárido, em uma área de 18 hectares. “Há demanda do mercado, mas também o sonho de resgatar o cultivo do algodão, produto que fez história no nosso Estado”, diz.

O projeto denominado “Santa Luzia do Algodão Colorido Natural e Orgânico” inclui novos 20 hectares: Comunidade Quilombola da Terra Nova, Comunidade Genipapo dos Lúcios, entre outras várias associações. O plantio iniciado no final de fevereiro, culminou no Dia de Campo, em 28 de junho, com a terra repleta de plumas. O evento reuniu instituições públicas e privadas atraindo a atenção de outros agricultores interessados no cultivo da planta que a empresa transforma em redes e acessórios de decoração para o mercado nacional e internacional.

O Dia de Campo é uma metodologia para compartilhar conhecimentos e tecnologia. Na ocasião foram abordadas as etapas da produção orgânica, desde o preparo do solo até a colheita, com destaque para o manejo do solo e controle biológico de pragas. Por isso, a Santa Luzia Redes e Decoração, antes de implementar o projeto, buscou apoio para criar condições favoráveis frente a ambiente climático vulnerável.

Da administração municipal de São Bento e Brejo da Cruz vieram os tratores para cortar e revolver o resistente chão. Da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), desenvolvedora das sementes, veio a inovação e o conhecimento. “O algodão colorido é uma planta resistente à seca que pode ser cultivada com pouca água — desde que essa pouca água seja ministrada ao cultivo na época certa”, explica o agrônomo Gilvan Ramos, da Embrapa Algodão. Como nenhuma das áreas têm irrigação, é preciso que a semente seja plantada antes da temporada de chuvas, ainda que ela seja escassa na região.

O apoio do Governo do Estado foi recebido por meio de técnicos agrícolas da Empresa Paraibana de Pesquisa, Extensão Rural e Regularização Fundiária (Empaer). A instituição tem a função de transferência de tecnologia, possibilitando que a propriedade tenha lucro e renda. “A Empaer tem o papel de organizar o sistema de produção orgânica, proporcionando aos agricultores familiares técnicas de manejo agroecológico de baixo custo, com melhoria na produtividade e que garanta Segurança Alimentar”, declarou Jefferson Ferreira, diretor de assistência técnica e extensão rural da Empaer.

Para o agricultor Paulo de Lima, 58 anos, que no passado viu a sua experiência com plantação de arroz e bananeira evaporar junto com a água do rio Piranhas, afluente da cidade, agora há uma nova perspectiva. “Antes era tudo desorganizado. A gente colhia e não tinha comprador, apenas atravessador”. No meio rural, a figura do atravessador não é bem vista porque, apesar de fazer a ponte entre o agricultor e os meios de distribuição e comercialização, na maioria das vezes não paga o agricultor de forma justa.

A Santa Luzia Redes e Decoração já planeja dobrar a área plantada em 2020. E também continuar pleiteando junto aos órgãos públicos o apoio para que os agricultores adquiram uma descaroçadeira. “Os caroços de algodão servem como base para ração de vacas leiteiras e bois de engorda. Este é um ótimo mercado. Os compradores viajam 1700 km para comprar caroços na Bahia. Como estamos a apenas 70 km de distância, estamos perdendo oportunidade de novos negócios”. O empresário, que trabalha na empresa o conceito da sustentabilidade, sabe que as atividades agrícolas nesta região têm indicadores de fragilidade. “O projeto tem potencial para garantir sustentabilidade econômica, social e ambiental. Mas não dá para fazer sozinho. É preciso garantir parcerias que proporcionam condições de operacionalização para os agricultores, trata-se de uma relação de interdependência onde juntos, somos fortes”, esclarece.

Sobre a empresa

A indústria têxtil Santa Luzia Redes e Decoração atua desde 1986 na criação e desenvolvimento de produtos decorativos pautados pela sustentabilidade e pela inovação — preservando característica cultural local com base no trabalho artesanal.

Armando Dantas, que iniciou sua carreira como artesão produzindo vendendo redes de porta em porta, hoje exporta produtos feitos com fios ecológicos para a Europa, a América do Norte e África.

Em 2018 o executivo teve seu trabalho premiado com “Reconhecimento de Excelência Artesanal do Cone Sul” concedido pelo World Crafts Council – WCC (Conselho Mundial de Artesanato) com recomendação da Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – Unesco.

Com Ascom