É através do olhar expressivo que imprimiu um estilo inconfundível, que o humorista Francisco Jozenilton Veloso, o ‘Shaolin’ tenta se comunicar com a família. A luta do comediante para sair do coma, completa três anos hoje. Acompanhado por uma equipe médica, composta por neurocirurgião, fisioterapeuta, psicólogo e fonoaudiólogo, em sua residência, no bairro do Catolé, em Campina Grande, o paraibano apresenta evolução lenta no quadro clínico, mas animadora. As esperanças dos familiares e amigos se voltam para os pequenos sinais que ele demonstra diariamente, e é a fé em Deus que tem dado forças para que eles continuem acreditando que Shaolin voltará a alegrar o país, com o humor clássico que o tornou conhecido nacionalmente. O artista entrou em coma após sofrer um acidente, em janeiro de 2011, na Alça Sudoeste, em Campina Grande.
De acordo com a esposa de Shaolin, Laudiceia Veloso, apesar da evolução no tratamento acontecer de forma lenta, tem correspondido às expectativas da família e a cada novo gesto que ele expressa reaviva a esperança e renova o sonho de vê-lo sair do coma. “A evolução está dentro do esperado. É uma recuperação lenta, mas muito satisfatória. Como é sabido de todos; o Shaolin ainda não consegue falar com a sua própria voz, mas se esforça muito para se comunicar conosco através do movimento dos seus olhos”, contou.
Segundo ela, após o acidente a rotina de toda família foi alterada e hoje, todos vivem em função de um mesmo objetivo: a recuperação total do humorista. “Foi necessária uma adaptação imediata aos fatos. Toda mudança desta natureza é dolorosa e muito difícil, mas acho que estamos nos saindo bem. A convivência é tranquila. Ele continua sendo o pai, o marido, o irmão, o filho… Procuramos deixá-lo o mais confortável e participante possível, dentro da rotina habitual”, explicou Laudiceia.
Para ela, o mais importante é que Shaolin se sinta inserido no contexto da família e para isso, junto com os filhos e os demais familiares, se revezam todos os dias na luta constante para integrá-lo a tudo que acontece. “Não deixamos ele de fora de nada que acontece. Procuramos informá-lo sobre tudo. Ele assiste televisão, vive informado e tem consciência de tudo o que acontece. Até as visitas é ele mesmo quem escolhe. Damos a Shaolin liberdade para suas escolhas para que ele se sinta sempre à vontade. Nós sabíamos, desde o primeiro diagnóstico, na noite do dia 18 de janeiro de 2011, que teríamos uma longa estrada pela frente. Continuamos muito confiantes na sua recuperação. O cérebro humano é imprevisível e pode nos surpreender a qualquer momento”, comentou a esposa.
“O bom filho à casa torna”
A mãe do artista, Elita Lacerda, 65, e os irmãos dele, Josevaldo Veloso, Joverlaine Veloso e Joseane Lacerda, não têm dúvidas de que Shaolin sairá do coma e afirmam que a cada novo gesto que ele emite representa uma renovação de fé e esperança. “Como diz o ditado: “O bom filho à casa torna” e é isso que vai acontecer. Estamos sempre muito confiantes e felizes. Não temos tristeza porque sabemos que Shaolin sairá do coma para a felicidade ser completa”, completou a mãe.
Enquanto isso, o filho mais novo do comediante, Lucas Veloso, que herdou do pai o dom de fazer humor, segue os passos dele, nos palcos da vida. “Ele é minha grande inspiração e por isso, escolhi também ser ator comediante. Tenho feito o máximo para levar humor às pessoas enquanto meu pai não está podendo levar a alegria dele para as pessoas, eu vou tentando fazer isso da melhor forma possível”, disse o filho.
O médico neurocirurgião Luciano Holanda, que foi um dos primeiros a atender Shaolin após o acidente, disse que não há como saber quando o paciente sai do estado de coma, podendo acontecer a qualquer momento ou até mesmo se prolongar pelo resto da vida. “Shaolin se encontra em um coma vigil onde o indivíduo apresenta os sinais como piscar de olhos, mastigação, lágrimas, mas não está conectado totalmente com a realidade. São atos que ocorrem com a ação automática do cérebro. Não tem como dizer que um paciente num estado desses sai do coma, porque pode acontecer de ser de uma hora pra outra, como também prosseguir pelo resto da vida. Já vi casos de pessoas que passaram três, quatro cinco anos e saíram do coma vigil e também vi casos em que o paciente não saiu”, contou o médico.
“Enquanto há vida também há esperança”
O neurocirurgião Luciano Holanda acredita que o atendimento a Shaolin após o acidente demorou o suficiente para que ele pudesse perder a oxigenação do cérebro, o que teria resultado no coma. “Um colega que fez o atendimento no local do acidente, me disse que quando encontrou o Shaolin, o cérebro dele já não estava mais recebendo oxigênio e quando isso acontece, chamamos de ‘anóxia’. Se a anóxia, que é a ausência de oxigênio no cérebro, for prolongada, pode resultar em uma lesão cerebral e até levar o paciente a óbito. No caso de Shaolin, o atendimento foi demorado o suficiente para que o cérebro parasse de receber oxigênio, mas ao mesmo tempo, foi rápido no sentido de salvá-lo e evitar a morte”, explicou o médico.
Para ele, no quadro atual em que o artista se encontra, a fé das pessoas que o rodeiam é um elemento fundamental para a recuperação. “O que posso dizer é que em uma situação como essa, o mais importante é ter fé e saber que enquanto há vida também há esperança”, ressaltou.
Amigo: “São três anos sem muita graça”
Para os humoristas, sobretudo os paraibanos, a ausência de Shaolin no cenário do humor representa uma perda para o mundo artístico. O comediante paraibano Rossini Macedo, o ‘Tonho dos Couros’, amigo e colega de trabalho de Shaolin, disse que desde o acidente, em 2011, que o humor não é mais o mesmo no Brasil.
“São três anos sem muita graça. Esse tempo todo o humorismo tem perdido muito. Shaolin é um humorista completo, que faz o tipo do humor clássico. Sempre foi uma de minhas referências e além de um excelente profissional, era um companheiro muito querido. Torcemos para que ele saia do coma e volte a alegrar o país. Sabemos que é difícil, mas temos fé que isso vai acontecer um dia. Ele vai acordar e do jeito que falava vai gritar de forma bem humorada: “Laudiceia, vem cá mulher!”, disse o artista.
MP apela de condenação
Apesar de ter sido condenado em novembro de 2012, o motorista Jobson Clemente Benício, ainda não começou a cumprir a pena determinada pelo juiz da 4ª Vara Criminal de Campina Grande, Wandemberg de Freitas Rocha. Na época, a pena de dois anos de prisão pelos crimes de lesão corporal e omissão de socorro foi substituída pela prestação de serviços comunitários. O magistrado também suspendeu o uso da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do motorista por um período de um ano.
No entanto, o promotor Sócrates Agra, representante do Ministério Público no caso, interpôs um recurso de apelação junto ao Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB), por que, segundo ele, esperava que ele recebesse a condenação máxima de quatro anos para o acusado, em regime fechado.
“O motorista deveria ter pego pena máxima de quatro anos, como apresentou o MP na denúncia. Ele foi imprudente e provocou o acidente que causou sérios danos ao humorista. Os graves ferimentos, comprovados que resultam no coma de Shaolin, são provas irrefutáveis. Tudo isso teria que ter sido levado em consideração. Mas o juiz então decidiu pela pena mínima e ainda com substituição por prestação de serviços. Por isso, estamos aguardando agora a apreciação do TJPB”, disse.
Acidente na Alça Sudoeste, em CG
Na noite do acidente, ocorrido em 18 de janeiro de 2011, na Alça Sudoeste, em Campina Grande, o humorista seguia do distrito de São José da Mata para Campina Grande, quando foi atingido por um caminhão, guiado pelo motorista Jobson Clemente, 23, que segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), invadiu a faixa contrária e acabou atingindo o carro de Shaolin. O motorista fugiu do local sem prestar socorro. Minutos após o acidente, ele foi socorrido por uma equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e levado para o Hospital Antônio Targino, onde deu entrada com traumatismo craniano.
Após passar pelos primeiros procedimentos e ser submetido a uma cirurgia, Shaolin foi levado para São Paulo, onde passou cinco meses, internado no Hospital das Clínicas, em coma e passando por várias cirurgias. Em junho de 2011, ele retornou a Campina Grande, sendo levado para sua casa, no bairro do Catolé, onde permanece até hoje.
Jornal Correio da Paraíba