Justiça comum devolve pontos ao Flamengo no Brasileirão: Lusa pode subir e Flu cair
Por - em 11 anos atrás 802
André Santos comemora gol pelo Flamengo: escalação do atleta no último jogo do Brasileirão 2013 tinha provocado a perda de quatro pontos (Celso Pupo/Fotoarena)
A previsão de uma nova reviravolta no Brasileirão 2013, desta vez nos tribunais da Justiça comum, começou a se confirmar. Por decisão de um juiz de São Paulo, o Flamengo, um dos clubes envolvidos no controverso julgamento sobre o desfecho da competição no Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), no fim do mês passado, deverá reconquistar os quatro pontos perdidos pela escalação irregular de André Santos, na última rodada. Por enquanto, nada muda no quadro do rebaixamento. A Portuguesa, porém, poderá se beneficiar, já que a decisão tomada na manhã desta sexta-feira abre precedente para que o clube paulista recorra à mesma estratégia jurídica para recuperar seus pontos. Se isso ocorrer, o Fluminense poderá voltar a figurar entre os quatro rebaixados à Série B do Brasileirão em 2014.
A liminar que beneficia o Flamengo é de autoria do juiz Marcello do Amaral Perino, da 42ª Vara Cível de São Paulo, que avaliou uma ação movida por um torcedor do Flamengo, Luiz Paulo Pieruccetti Marques, sócio do clube. Ele se baseou no Estatuto do Torcedor para pedir a anulação da punição ao clube. A legislação federal afirma que uma suspensão a um clube ou atleta só passa a valer no momento em que é publicada pelo site oficial da entidade que promove um torneio – no caso, a CBF, que só divulgou publicamente as punições a André Santos e Héverton, da Portuguesa, na segunda-feira seguinte à rodada final do Brasileirão. Com isso, André Santos teria condições de jogo e o Flamengo, portanto, não poderia ser punido. Torcedores da Portuguesa já prometiam ir à Justiça comum usando o mesmo argumento, e a decisão favorável ao Flamengo deverá encorajar ainda mais ações nesse sentido.
"A punição imposta referente à perda de pontos e cobrança de multa é irregular e merece, portanto, ser suspensa até decisão final do processo'', escreve o juiz Perino em sua decisão sobre o caso. O próprio juiz aponta a possibilidade de a Portuguesa ser beneficiada pela ação movida pelo torcedor do Flamengo, que apontou como motivação para ir à Justiça justamente a possibilidade de recuperação dos pontos pelo clube paulista a partir da argumentação baseada no Estatuto do Torcedor. Se a Portuguesa recuperasse os pontos e o Flamengo não fosse beneficiado por decisão semelhante, seria o clube do Rio que ficaria na Série B. Além das ações dos torcedores na Justiça comum, há contestação à decisão do STJD pelo Ministério Público de São Paulo, que instaurou inquérito nesta semana para investigar a perda de pontos da Portuguesa no tribunal desportivo. O trecho do Estatuto do Torcedor que considera inválidas as decisões que não forem devidamente publicadas também é o argumento que fundamenta a atuação do MP nesse episódio.
Por que a justiça do futebol deve mudar
Modelo obsoleto
Os grandes campeonatos no exterior – inclusive as competições da Fifa – não têm julgamentos complexos em casos corriqueiros como expulsões de atletas. Há um regulamento que prevê claramente as penas para cada tipo de infração. Não é preciso reunir um tribunal para discutir o caso: basta aplicar as regras, enquadrar cada caso dentro das penas previstas e definir a suspensão do atleta. O caso de Héverton, por exemplo, não precisaria ir ao tribunal às vésperas do jogo. Logo depois da rodada em que sua expulsão aconteceu, a organização da competição simplesmente confirmaria sua punição por ser expulso ao xingar a arbitragem.
Sistema quase amador
Ainda que o modelo atual fosse mantido, seria indispensável melhorar os procedimentos do tribunal e da CBF. Julgar um atleta na véspera do jogo é uma incrível distorção – uma equipe só fica sabendo se poderá ou não escalar o jogador a horas de ir para o estádio. Além disso, a falta de um sistema mais preciso de notificação sobre as penas dá margem a erros grotescos como o que rebaixou a Portuguesa. O site da CBF publica os resultados dos julgamentos. Como a sessão do caso Héverton se estendeu até o início da noite de sexta, fora do expediente dos funcionários da entidade, a decisão só apareceu no site na tarde de segunda.
Tribunal antiquado
Com mais de meia centena de integrantes, entre procuradores e auditores, o STJD tem um organograma inchado e complexo. A escolha dos integrantes do tribunal não costuma levar em conta aspectos exclusivamente técnicos – nos bastidores, há acirrada disputa por uma indicação, já que o órgão, com casos de projeção nacional como o da Portuguesa, acaba servindo de vitrine para seus procuradores e auditores. O presidente do STJD é Flávio Zveiter, que entrou em 2000, aos 19 anos, quando ainda cursava o terceiro ano de Direito no Rio. Ele foi sabatinado pelo próprio pai, Luiz Zveiter, que presidia o tribunal naquela época.
Pouca credibilidade
As decisões controversas do passado, com direito a viradas de mesa absolutamente constrangedoras, fazem o torcedor comum ter profunda descrença na justiça do futebol. Em julgamentos anteriores, suspeitas sobre paixões clubísticas, proteção a equipes mais tradicionais e poderosas e conflitos de interesses ficaram marcados na cabeça do fanático por esporte. Resultado: quando o julgamento enfim cumpre a regra da competição, como aconteceu no caso da Portuguesa, há margem para as reclamações e a desconfiança do torcedor, já que o desempenho do tribunal não é consistente. Ou seja, a sensação de injustiça ainda prevalece.
Diretoria da Portuguesa durante julgamento no Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, no Rio de Janeiro – Armando Paiva/Fotoarena
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