Parlamento de Cuba aprova nova Constituição e texto vai a referendo; veja o que muda.
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Com recuos nos temas relacionados à família e ao modelo do Estado, o Parlamento de Cuba aprovou a versão final da nova constituição neste sábado (22). O texto ainda precisa passar por referendo, previsto para 24 de novembro, para entrar em vigor.
Diferentemente da primeira versão, o novo texto não terá mais a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Em vez disso, o Parlamento decidiu que haverá um outro referendo para aprovar o Código da Família – que definirá, portanto, se Cuba ampliará o matrimônio civil para homossexuais. A união estável, porém, fica garantida.
Em outro recuo, a constituição volta a determinar que Cuba é um país comunista – o termo havia sido retirado da primeira versão.
As alterações foram definidas ao longo de quatro meses de consultas populares, entre agosto e novembro – algumas feitas por cubanos morando em outros países. Ao todo, a nova versão trará 760 modificações propostas em 133 mil reuniões.
Segundo o jornal estatal “Granma”, a “imensa maioria das propostas não questiona” o sistema cubano. Também de acordo com a publicação, o texto recebeu o apoio de 62% da população, contra 3% de rejeição. Outros 35% cubanos expressaram “expectativas, sugestões e preocupações” sobre a nova constituição.
Apesar dos recuos, a nova constituição – se aprovada em fevereiro – trará mudanças nas áreas econômica e social de Cuba. Os resultados, porém, devem demorar a aparecer, uma vez que apenas o “Granma” – que é do Partido Comunista – fornece as informações sobre as discussões do novo texto.
Confira abaixo o que muda e o que continua com a nova constituição de Cuba.
O que muda?
Reconhecimento da propriedade privada e do enriquecimento individual – com limites;
- Criação do cargo de primeiro-ministro para chefiar o governo;
- Discriminação a pessoas LGBT passa a ser proibida;
- Haverá um referendo para definir casamento civil entre pessoas do mesmo sexo;
- Garantia de presunção de inocência e habeas corpus em processos criminais;
- Estado laico – definição não aparecia no texto antigo;
- Estabelece a liberdade de imprensa, antes vinculada aos “fins da sociedade socialista”;
- Determina 60 anos como idade máxima para o cargo de presidente da república;
- Mandato de cinco anos para o presidente, com direito a uma reeleição;
- Cubanos poderão denunciar violação de direitos constitucionaiscometidos pelo governo.
O que não muda?
Bandeira de Cuba é clicada pendurada ao lado de fotografias de Raúl e Fidel Castro — Foto: Reuters/Stringer
- Cuba continua um país comunista;
- O Partido Comunista é o único reconhecido na ilha;
- Economia planificada, embora haja reconhecimento ao mercado;
- Somente o Estado detém posse das terras em Cuba;
- Assembleia Nacional elege presidente e primeiro-ministro;
- Meios de comunicação são de “propriedade socialista”, jamais privados;
O que não está claro?
- Quais os limites para a propriedade privada;
- Se haverá possibilidade do surgimento de uma imprensa livre e independente;
- Como os cubanos poderiam denunciar violações de direitos cometidas pelo governo;
- Se as mudanças serão suficientes para ampliar as relações de Cuba com outros países.
Cuba em 2018
Apesar de a Constituição em vigor ter passado por alterações desde sua adoção em 1976, é a primeira vez que o regime cubano organiza uma reforma completa no texto. A proposta, inclusive, foi vista com surpresa quando anunciada em meados de 2018.
À época, o professor de relações internacionais Maurício Santoro, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), apontou em julho quatro prováveis fatores que levaram Cuba a fazer essa mudança:
Colapso econômico na Venezuela, aliada econômica de Cuba por causa do petróleo mais barato;
- Governo “imprevisível” de Donald Trump nos Estados Unidos, eleito em 2016;
- Baixo crescimento econômico nos demais países da América Latina nesta década;
- Derrocada de políticos de esquerda nas eleições latino-americanas, mais “amigáveis”, segundo Santoro, ao regime cubano.
Presidente de Cuba, Miguel Diaz-Canel, fala durante uma cerimônia de boas-vindas aos médicos cubanos recém-chegados do Brasil no Aeroporto Internacional Jose Marti, em Havana, nesta sexta-feira (23) — Foto: Fernando Medina/ Reuters
O regime de Cuba também colocou pela primeira vez um civil no cargo máximo do poder desde 1959, ano da revolução. Miguel Díaz-Canel foi escolhido em abril pela Assembleia Nacional para substituir Raúl Castro – este, por sua vez, coordenou os debates da nova Constituição.
Porém, assim como as mudanças na constituição não significam, necessariamente, uma transformação no regime, a eleição de Díaz-Canel mantém o poder do Partido Comunista de Cuba (PCC). O novo presidente faz parte do mesmo partido dos antecessores, e não abriu mão de exaltar a “revolução” nos discursos.
As relações de Cuba com o mundo pouco mudaram com a chegada de Díaz-Canel. O cubano visitou, neste ano, países da Ásia considerados comunistas: Coreia do Norte, Laos e Vietnã. Ele também criticou Donald Trump, mas se encontrou com opositores do presidente norte-americano além de visitar o país para reuniões com grandes empresas de tecnologia.
Em relação ao Brasil, Díaz-Canel retirou Cuba do Mais Médicos após o programa receber críticas do presidente eleito Jair Bolsonaro. O brasileiro respondeu que o cubano não aceitou as exigências para a continuidade do programa, como teste de capacidade e salário integral aos médicos estrangeiros. O futuro governo também desconvidou Díaz-Canel da cerimônia de posse de Bolsonaro.
G1