Senado recua de pontos que restringiam fiscalização de campanhas e aprova fundo eleitoral sem valor definido

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O Senado aprovou nesta terça-feira (17) um projeto que viabiliza recursos para as campanhas eleitorais municipais em 2020. O valor do fundo eleitoral para o financiamento, contudo, ainda terá de ser definido na lei orçamentária, que será votada no fim deste ano.

O texto foi aprovado de forma simbólica, ou seja, sem contagem de votos. Alguns senadores manifestaram voto contrário ao texto.

De acordo com a redação aprovada, o valor do fundo poderá ser menor, igual ou superior ao R$ 1,7 bilhão do fundo eleitoral das eleições de 2018.

Durante a sessão desta terça, senadores afirmaram que há um “compromisso” para que o valor do fundo eleitoral de 2020 seja o mesmo de 2018.

Por acordo, os senadores retiraram pontos polêmicos da proposta aprovada pela Câmara, que poderiam, segundo especialistas, dificultar a fiscalização de campanhas eleitorais.

Como houve alterações, o texto volta para a Câmara, onde a proposta teve origem. Os deputados poderão ignorar a alteração feita pelo Senado e resgatar todos os pontos controversos do texto, aprovando a redação anterior e encaminhando o texto à sanção presidencial.

Em meio à discussão da proposta, alguns senadores iniciaram um movimento para derrubar o projeto.

Eles diziam que seria melhor rejeitar o texto a fim de evitar que os deputados resgatem os pontos que podem reduzir a transparência do processo eleitoral.

No entanto, o acordo firmado durante reunião de líderes prevaleceu, e a proposta foi aprovada.

O projeto ajusta a redação da legislação eleitoral no ponto que trata do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas, o chamado fundo eleitoral, criado em 2017, com recursos de emendas parlamentares de bancadas estaduais.

O texto aprovado retira a exigência de um percentual mínimo de 30% de emendas, previsto atualmente em lei.

De acordo com a redação proposta, o fundo será constituído por dotações orçamentárias da União em ano eleitoral, em valor ao menos equivalente:

ao definido pelo Tribunal Superior Eleitoral, a cada eleição, com base nos parâmetros definidos em lei;

ao percentual a ser estabelecido na lei orçamentária anual para emendas das bancadas estaduais no Congresso, de caráter impositivo.

Relator da proposta, o senador Weverton Rocha (PDT-MA) explicou a alteração que o projeto estabelecerá, se sancionado, no fundo eleitoral.

De acordo com o relator, na lei de 2017, o fundo eleitoral para 2018 foi composto de:

recursos que as emissoras de TV e rádio tinham de incentivos por conta da propaganda gratuita em período que não era eleitoral;

30% das emendas de bancada estaduais.

Com essa composição, chegou-se a um valor de R$ 1,7 bilhão para a eleição de 2018.

“Com essa legislação atual, não poderia funcionar para a eleição de 2020, porque é outra lei orçamentária e outra equação. E, mesmo se pudesse, nós tiramos os 30% porque aumentaria consideravelmente o valor do fundo eleitoral, tendo em vista que as emendas de bancada, por serem impositivas, vão ser bem maiores”, afirmou Weverton Rocha.

Recursos de emendas parlamentares de bancadas estaduais geralmente são destinado para investimentos em áreas como saúde, educação, infraestrutura, saneamento básico, entre outras.

Histórico

Inicialmente, o projeto, que tem origem na Câmara, alterava somente regras para a remuneração de funcionários de partidos políticos. Mas os deputados transformaram o texto em uma minirreforma eleitoral e encaminharam a proposta para o Senado.

De acordo com especialistas e entidades, o texto enviado pela Câmara reduzia a transparência e dificultava a fiscalização de eventuais irregularidades em campanhas eleitorais.

Segundo especialistas, havia trechos que dificultariam a fiscalização – por parte dos tribunais eleitorais – de eventuais irregularidades em campanhas.

Entre esses trechos, estavam:

prorrogação de prazos para a prestação de contas;

possibilidade de utilização de quaisquer sistemas de contabilidade disponíveis no mercado;

mais tempo para a correção de informações apresentadas à Justiça Eleitoral.

O texto aprovado pelos deputados também permitia a utilização do Fundo Partidário – composto por dotações orçamentárias da União (recursos públicos), multas, penalidades e doações – para o pagamento de multas eleitorais, para a compra ou locação de bens móveis ou imóveis e para o custeio de impulsionamento de publicações em redes sociais.

A proposta, que foi desidratada no Senado, também permitia que o fundo partidário – dinheiro público repassado mensalmente às legendas para o financiamento de suas atividades – fosse usado para pagar advogados e contadores em processos relacionados aos partidos ou aos candidatos.

Pelo texto da Câmara, essas despesas não seriam contabilizadas para o teto de gastos da campanha. Além disso, doações de pessoas físicas para despesas com advogados ou contadores também poderiam ultrapassar o limite hoje imposto pela lei – um doador pode contribuir com até 10% da renda do ano anterior.

Especialistas dizem que essa flexibilização abriria margem para corrupção e prática de caixa dois.

Flexibilização das regras

O projeto aumentava os prazos para entregar as prestações de contas, tanto do fundo partidário quanto do fundo eleitoral.

Em relação ao fundo partidário, a data limite passaria de 30 de abril para 30 de junho. Já o prazo para o fundo eleitoral, que a prestação de contas tem que ser feita 30 dias após o primeiro turno e 20 após o segundo, passaria a ser também dia 30 de junho do ano seguinte à eleição.

O texto também dizia que a prestação de contas dos partidos poderia ser feita em “qualquer sistema de contabilidade disponível no mercado”.

Com isso, o uso do sistema da Justiça Eleitoral se tornaria opcional. E essa falta de padronização tornaria mais difícil a fiscalização, de acordo com especialistas.

Em caso de eventuais erros, omissões ou atrasos, candidatos e partidos poderiam corrigir as informações prestadas até o dia do julgamento das contas.

Só haveria punição para os erros caso fosse provado que o partido agiu com dolo, sabendo que estava cometendo uma infração.

Além de dificultar a fiscalização das contas, o projeto também dizia que as contas bancárias dos partidos estariam fora do controle mais rígido da Receita Federal sobre pessoas politicamente expostas.

Debate no plenário

Durante a sessão, a líder do PSB, senadora Leila Barros (DF), posicionou-se contra o projeto e disse não acreditar que a Câmara manterá o texto aprovado pelo Senado.

“Pensando em Câmara dos Deputados e no que virá por ela, eu digo que hoje eu vou votar contra, porque não confio no que virá dela [Câmara]. Eu confio no senhor [Davi Alcolumbre]. Quero parabenizá-lo pela condução tanto do senhor como dos demais líderes. Mas, diante de tantas aberrações, de desrespeitos, eu não tenho como acordar com isso, porque eu não confio. Confio nos senadores, mas não confio na forma como é o tratamento feito na Câmera para conosco”, disse Leila.

O senador Eduardo Girão (Pode-CE) perguntou a Marcelo Castro (MDB-PI), presidente da Comissão Mista de Orçamento (CMO), colegiado que analisa a lei orçamentária, se ele poderia garantir que a lei orçamentária não elevará o valor do fundo eleitoral em relação ao valor de 2018.

“O senhor [Marcelo Castro] pode, para nós aqui, garantir que será mantido esse teto que nós estipulamos num acordo, para que possamos votar com serenidade essa matéria? Ou seja, que será no máximo o valor da última eleição de R$ 1,8 bilhão?”, indagou Girão.

Em resposta, Marcelo Castro disse que não pode se responsabilizar pelo que a Câmara irá fazer.

Castro afirmou que há um compromisso público de todos os líderes partidários que negociaram a matéria. Segundo ele, o compromisso é o de que os recursos para 2020 serão iguais aos de 2018.

“Foi um compromisso público. Isso envolve o quê? O Senado, as lideranças do Senado. E eu quero acreditar que os líderes que estavam lá vão levar para as suas bancadas essas informações, para que as bancadas possam votar de acordo com esse entendimento. É evidente que nós não podemos nos comprometer e nos responsabilizar por aquilo que a Câmara vai fazer e vai votar”, completou Marcelo Castro.

O senador Ângelo Coronel (PSD-BA) chegou a apresentar um requerimento para que fosse votado o polêmico texto aprovado pela Câmara e não o substitutivo proposto no Senado.

O parlamentar baiano desistiu do pedido depois que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), fez um apelo para que o plenário respeitasse o acordo firmado na reunião de líderes.

G1