A Igreja nasce de Jesus
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Terceiro Domingo de Páscoa, terceira aparição de Jesus Ressuscitado a seus discípulos às margens do Lago da Tiberíades ou mar da Galiléia(cf. Jo 21,1-19). No chamado “epílogo” do quarto evangelho, um relato funde dois episódios: uma pesca milagrosa e uma refeição pós-pascal.
A figura de Pedro é central nestes episódios ricos de simbolismo: a barca representa a Igreja, agora guiada por Pedro; os peixes representam o grande número dos que aderiram à pregação dos apóstolos; a refeição frugal de peixes e pão, ao calor das brasas, tomada à beira do lago é referência à Eucaristia. Tudo nos ajuda a compreender a presença de Jesus Ressuscitado na vida da Igreja.
A Igreja nasce de Jesus, morto e ressuscitado, que se faz presente em meio aos seus discípulos e de seu Espírito, não do esforço de seus discípulos. É evidente que o esforço e tenacidade dos discípulos também foram necessários, mas foi o Espírito de Jesus, o Espírito Santo, que deu seiva e vida à primitiva Igreja cristã.
Quando os discípulos de Cristo não estão atuando movidos pela Palavra e o Espírito de Jesus, a Igreja tem se desorientado lamentavelmente, e tem perdido eficácia e fecundidade. Temos que reconhecer que isto ocorreu mais de uma vez ao longo de toda a história do cristianismo e esta tem sido a causa de que a Igreja tenha sido às vezes, lamentavelmente, muito pouco cristã.
Os discípulos de Jesus haviam passado a noite no lago trabalhando duro como espertos pescadores que eram e não havia pescado nada, mas quando se deixam guiar pelo Mestre recolhem tal quantidade de peixes que mal podiam arrastar as redes para a barca.
É evidente que o autor do quarto evangelho dá a este relato da pesca milagrosa uma intenção teológica que vai além do fato, temos de reconhecer que o que ele quer dizer a seus leitores é que quando a Igreja cristã não se deixa guiar por Jesus perde a eficácia e autenticidade e pode chegar a ser mais que sinal do Reino de Deus, um contra-sinal.
E o que dizemos da Igreja em geral, o podemos dizer de cada um de nós em particular e de cada um dos grupos, pastorais, movimentos e comunidades cristãs que formamos o conjunto da Igreja cristã.
Quanto mais apartados vivamos do Evangelho de Jesus, mais contra-sinal de seu Reino seremos e não poderemos nem nós mesmos considerar-nos Igreja nascida de Jesus, nem temos direito a pedir à sociedade que nos veja como tais. Façamos um sério exame de consciência sobre este ponto, cada um de nós em particular e cada um dos grupos e comunidades que formamos o conjunto do que chamamos Igreja cristã.
Mas, o verdadeiro milagre no episódio da pesca milagrosa não é uma rede que se enche de peixes. O maior milagre é que a traição covarde de Pedro se transforma em confissão de amor. Após a refeição acontece um belíssimo diálogo: “Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?
Ele lhe respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo, Jesus lhe disse: Apassenta meus cordeiros. Segunda vez disse-lhe: Simão, filho de João, tu me amas? Sim, Senhor, disse ele, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Apascenta minhas ovelhas.
Pela terceira vez, lhe disse: Simão, filho de João, tu me amas? Entristeceu-se Pedro porque pela terceira vez lhe perguntara: Tu me amas? e lhe disse: Senhor tu sabes tudo; tu sabes que te amo. Jesus lhe disse: Apascenta minhas ovelhas.” (vv. 15-17)
Pedro sabia que o Senhor lhe amava mais que o suficiente para perdoar seu pecado. Ele que havia chorado amargamente seu pecado, sabia que o Mestre lhe voltaria a perdoar porque lhe havia ensinado a perdoar sete vezes sete, poderia perdoar-lhe. E não se equivocou. O Senhor lhe acolhe com o mesmo carinho de sempre, lhe olha com o mesmo profundo olhar, com a mesma compreensão de antes.
A história de Pedro também se pode repetir hoje em nossa Igreja e em cada um de nós. Jesus sabe da debilidade e “negações” de seus pastores e fieis, apesar de todos os dias lhe declararem o quanto o amamos. Não temos que demostrar-lhe competência nenhuma, nada, somente apoiar nosso ministério, nosso ofício pastoral, nosso amor em seu Amor, e nossa fidelidade em sua Fidelidade.
Como Pedro e seus companheiros continuamos a ouvir o forte e comprometedor convite de Jesus: “Segue-me!” (v. 19) A cada um de nós Jesus Cristo nos propõe segui-lo com uma missão, um encargo concreto. Nisto consiste ser cristão. A intenção do texto é assinalar a missão que Cristo encomenda a Pedro de pastorear a sua Igreja.
Mas é o amor a Cristo a primeira condição para ser “pastor” em sua Igreja. A missão de todo cristão, e em especial a dos pastores, é tranmitir a fé. Mas isto não se faz só com dsicursos eloquentes, mas sim na experiência de fé em Cristo Ressuscitado.
Seja qual for a nossa missão ou função na Igreja e no mundo, elas só terão sentido na medida em que realmente descobrirmos como Pedro que “Tu sabes tudo” de mim, de cada um de nós.
Que poderemos amar-lhe como Ele quer ser amado, amarmos a Jesus, a Igreja e aos outros, com um amor que só se faz autêntico se se faz entrega generosa aos mais pobres e necessitados de amor.
Ao mesmo tempo tomamos consciência das dificuldades que esse amor, esse papel, esse ministério traz. Chegará o momento em que, como foi profetizado a Pedro:
“Quando fores velho, estenderás as mãos e outro te cingirá e te conduzirá aonde não queres” (v.18), o levarão amarrado, lhe perseguirão e o encarcerão, lhe caluniarão e lhe maltratarão, lhe crucificarão. A profecia se cumpriu em Simão Pedro e se seguirá cumprindo. Porque também hoje o mesmo que ontem e amanhã, o que está no lugar de Pedro, o vigário de Cristo, o Papa Francisco sofre em sua carne a dor de ser fiel a seu divino Mestre.
Em algum momento e por diversos canais, a Igreja, o sucessor de Pedro e os presbíteros estamos expostos, mas “os delitos de alguns não podem absolutamente ser usados para manchar o inteiro corpo eclesial dos presbiteros.
Quem o faz, comete uma clamorosa injustiça”, disse o Cardeal Cláudio Hummes. Como Igreja não podemos perder a esperança. Escutamos que não há solução para a crise que estamos enfrentando, mentira! A Páscoa, a presença viva do Senhor Ressuscitado em nosso meio, em sua Igreja, nos dá a força e a tenacidade dos que como Pedro seguiram como opção de amor o Senhor.
Padre José Assis Pereira