Abertos à esperança

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Hoje iniciamos um novo Ano Litúrgico. Iniciamos igualmente o Tempo do Advento que começa quatro domingos antes do Natal. O Advento se apresenta como um prelúdio introdutório do mistério da vinda do Filho de Deus à nossa história humana, um prelúdio de Natal.

Advento, em latim “adventus”, significa vinda, presença ou “parusia” em grego. Para nós cristãos católicos, o Advento é para o Natal e festas epifânicas o que a Quaresma é para a Páscoa.

Ambos os tempos são penitenciais, mas não o são da mesma maneira. O Advento nos abre para a alegre esperança, e a Quaresma, nos adentra no mistério da morte e ressurreição de Jesus.

O Advento é um tempo com muito conteúdo teológico, poético e simbólico. Um simbolismo que se traduz no fato de que, para os cristãos, o Advento é um tempo de preparação, de espera deste Jesus que; como nasceu um dia em Belém há mais de 2000 anos, seguirá “nascendo” em todos os corações que o reconhecem como o “Filho de Deus”. Jesus vem como o enviado do Pai, aquele com e por quem o Pai revela a sua palavra e sua graça.

Viver o Advento de Jesus passa por, como lemos no evangelho, estar preparados e vigilantes porque não sabemos o dia nem a hora. Isto, ao invés de preocupar-nos ou assustar-nos, deveria abrir-nos à esperança de que efetivamente, o Senhor vem salvar o mundo.

O que significa que, a esperança que celebramos no Advento é um espera operosa ou ativa, que nos põe em “sintonia” com o mundo, e nos compromete ativamente com ele.

A esperança e o Advento nos colocam já na encarnação do Filho e, não, contudo na plenitude e salvação futuras da humanidade. O Advento é um tempo favorável para a redescoberta de uma esperança não vaga nem ilusória, mas certa e confiável, porque está “ancorada” em Cristo, Deus feito homem, rochedo da nossa salvação.

Desde o inicio, como sobressai do Novo Testamento e é acentuadamente assinalada pelas cartas dos Apóstolos, uma nova esperança distinguia os cristãos daqueles que viviam a religiosidade pagã. Escrevendo aos Efésios, São Paulo recorda-lhes que, antes de abraçar a fé em Cristo, eles viviam “sem esperança e sem Deus neste mundo” (Ef 2,12).

Esta expressão parece mais atual do que nunca, por causa do paganismo dos nossos dias, de modo particular o niilismo contemporâneo, que corrói a esperança no coração das pessoas, induzindo-as a pensar que dentro delas e ao seu redor reina o vazio: nada antes do nascimento, nada depois da morte. Na realidade, quando falta Deus, falta a esperança. Tudo perde sua “consistência”. É como se viesse a

faltar a dimensão da profundidade e todas as coisas permanecessem niveladas. Está em jogo a relação com a plenitude da vida, para a qual cada ser humano está, por assim dizer, orientado. A esta expectativa do ser humano, Deus respondeu e Cristo com o dom da esperança.

No Advento escutamos as palavras dos profetas, sobretudo a palavra vibrante e esperançosa do profeta Isaias (cf. Is 2,1-5) que abre adequadamente a celebração litúrgica do Advento com a imagem de Jerusalém, “cidade da paz”, como lugar do encontro de toda humanidade é uma bela expressão do universalismo de Isaías.

O Advento é uma grande oportunidade para a renovação na Jerusalém-Igreja de sua consciência universal em todos os níveis: geográfico, cultural, social, religioso etc. A Igreja tem como vocação ser um sinal universal de salvação para a humanidade.

O Evangelho deste Primeiro Domingo do Advento (cf. Mt 24,37-44) nos convoca à vigilância e à esperança. É que o Advento parte da experiência de uma história gasta, esgotada e aponta a uma esperança nova; a esperança de um salvador que traga luz, justiça e paz a humanidade.

Para Mateus este mundo não pode seguir sem Deus, Ele tem que tomar as rédeas da história humana, como no tempo de Noé e do dilúvio.

Jesus compara as pessoas que vivem nesta fase final, que caminham para o último momento, com a geração do tempo de Noé. Viviam no desconhecimento e na despreocupação total pelas coisas que se avizinhavam. E na comparação, destaca-se a auto-segurança e o gozar a vida como contraponto necessário para realçar uma mudança radical: da segurança para a destruição.

Os cristãos não devem deixar-se surpreender por tão lamentável imprevisto. Sabem muito bem o que os espera e que o caráter repentino dos últimos acontecimentos, requer a nível coletivo ou individual, não adiar a conversão para o último momento.

“Ficai atentos! porque não sabeis em que dia virá o Senhor… Ficai preparados! Porque na hora em que menos pensais, o Filho do Homem virá.” (vv. 42.44) A vida de Noé, a sua atitude traduz perfeitamente a posição do homem da mulher de fé. Ele não contava com sinal nenhum para depreender que se avizinhava uma catástrofe.

Confia, única e exclusivamente, na Palavra de Deus, e leva a cabo aquela construção absurda num país seco, guiado unicamente pela ordem que de Deus recebera. Está, pois, na mais pura linha de Abraão, o pai e modelo dos crentes, na linha daqueles que põem incondicionalmente a sua fé em Deus.

Aos cristãos, é-lhes dito: sede como Noé e não como os seus contemporâneos. Porque, quando vier o Filho do homem, repetir-se-á o que então aconteceu.

No mundo agitado em que vivemos onde não se sabe nem se quer esperar, não poucas vezes a tristeza, o desânimo, o pessimismo, a desesperança, se abate sobre os cristãos. O acúmulo de más notícias; de guerras, mortes, crises, criam um ânimo de desencanto, de desesperança.

É evidente que a história, necessita ser sempre renovada. Isso é o que buscam as pessoas de todas as religiões e tendências. A humanidade é chamada a recomeçar e à conversão, porque sempre é possível, para o ser humano recomeçar.

No Advento fazemos nossos os sentimentos de Maria e de José na espera de seu filho Jesus. Paulo VI recomendava na exortação “Marialis Cultus”, dar ao Advento um especial sentido mariano. Maria há de ser para nós o grande modelo. A encíclica “Spe Salvi” de Bento XVI se encerra com uma prece dirigida a Maria, “estrela da esperança”. A vida humana é uma viagem no mar da história.

Neste mar, às vezes escuro e agitado por ondas e tempestades, devemos olhar para o alto a fim de descobrir os astros que nos apontam a rota, isto é, que nos ensinam a viver com retidão.

O astro maior, “a luz”, é Jesus Cristo. “Mas para chegar até Ele, precisamos também de luzes vizinhas, de pessoas que dão luz recebida da luz dele e oferecem, assim, orientação para nossa travessia” (S.S. n.49).

A partir deste domingo, qualquer pessoa que entre em uma Igreja tem de experimentar que começou um ciclo diferente, uma espécie de “ar” diferente.

Esta impressão, de entrada, pode ajudar-nos a “conectar” e viver com seriedade este tempo. Conectar com esse eu interior que se pergunta e busca resposta a suas interrogações. Poder examinar nossas vidas, e reconhecer o que é digno de melhorar e tomar a iniciativa.

Só assim, acredito, poderemos esquadrinhar os sinais de Deus. Conectar também as pessoas que estão ao nosso redor, sobretudo, com os pobres e marginalizados. Como disse Jesus: “Levantai-vos e erguei a cabeça, porque a vossa libertação está próxima” (Lc 21,28).

Por Padre Assis